sábado, 6 de março de 2021

O que você faria se tivesse 18 anos ? Pensamentos, livros e novos aportes

 Olá pessoal,

O que faria se tivesse 18 anos ?

Um dia desses um primo que considero muito, que está perto de fazer 18 anos, me perguntou o que eu faria se estivesse no lugar dele - em termos de profissão, faculdade, essas coisas. Pensei, refleti e tudo o que consegui responder foi: não tenho a menor ideia.

Contextualizando: no meio da pandemia, esse "quase adulto" está em dúvida sobre o que fazer com a própria vida. Teve uma criação parecida com a minha: periférico de grande cidade, sem herança, sem QI, que estudou em uma escola razoável graças ao esforço dos pais. Nossa grande diferença é que, enquanto eu tive uma vida mais "na rua", ele ficou mais trancado em casa.

Depois de muito pensar - e lembrar dos meus 18 anos - vi o quanto essa geração atual é extremamente ferrada em termos de perspectiva e esperança quanto ao futuro. Nunca foi tão grande a parcela de jovens "nem nem". Nem trabalham, nem estudam. É uma pandemia dentro de uma pandemia.

Pesquisando sobre o assunto, achei esse artigo da BBC Brasil, com o título : "Os danos permanentes para os jovens que começam a trabalhar em tempos de crise". 

Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/geral-55303234

Basicamente, os textos que li dizem que os jovens e adultos - entre 20 e 35 anos - que passaram por crise de 2008, crise econômica a partir de 2015 - no Brasil -  e pandemia da covid são ferrados e, muito provavelmente, ferrados por toda a vida. Isso tem consequências no mundo inteiro. É o tal do "efeito cicatriz". Se começou mal no mercado de trabalho, a tendência é que essa "cicatriz" se perpetue por toda a vida. (https://g1.globo.com/economia/noticia/2020/08/11/jovens-desempregados-correm-risco-de-carregar-cicatrizes-permanentes-da-pandemia-diz-oit.ghtml).

Vendo tudo isso e a tendência pessimista nas mídias sociais, ainda continuei pensando no assunto.

Meus avós tiveram uma vida ferrada - vindo da roça para a capital -. Meus ascendentes (europeus, africanos e indígenas - já fiz exame de DNA) também passaram por poucas e boas, dadas as circunstâncias horrorosas e de vida difícil - viagens perigosas, guerras, escravidão, doenças, enfim... a vida nunca foi fácil. Não podemos imaginar que somos os únicos humanos que sofreram. Na verdade, em termos comparativos, sofremos até pouco. Ou prefere voltar para o tempo em que precisava caçar proteína e lutar por um gole de água ? Para o tempo em que a peste negra matava milhões na Europa, sem nenhuma perspectiva de vacina ou tratamento ? O problema é que, para o nosso cérebro, não existe um medidor universal de sofrimento; quem está no meio dessa pandemia, com covid, desempregado e sem perspectiva está em grande e absoluto desespero. Nosso cérebro não se compara com o sofrimento do antepassado; se compara, normalmente, com familiar, amigo e - agora - com celebridade de "instagram" - o mal do século XXI. Nossa mente não tem  capacidade para lidar com a comparação excessiva dos tempos atuais. Isso está destruindo muitas pessoas.

Enfim, após pensar sobre o assunto, aconselhei o primo no seguinte sentido :

"A vida é muito dura com quem é pobre nesse país. Ninguém deve a você coisa alguma e deve lutar muito para conquistar seu espaço. Não se iluda com a ideia de que você tem muitas opções. Na verdade, considerando suas habilidades e experiências, suas opções são poucas. Algumas delas são:

1) Migrar para um país com melhores opções, após o fim da pandemia - Quando eu tinha 18 anos essa não seria minha primeira opção - as circunstâncias eram outras. Hoje, sem nenhuma dúvida, seria meu primeiro pensamento, por diversas razões que, para mim, parecem bem óbvias. Sei que viver fora é difícil para caramba. Sei de xenofobia, preconceito, blá, blá, blá - até parece que pobre no Brasil não sofre nada disso. Aprender uma língua estrangeira e desenvolver habilidades que podem ser úteis no exterior é essencial. Ser um bom pedreiro - marceneiro, com noções de inglês, pode garantir sua sobrevivência mais do que um canudinho de papel em uma uniesquina qualquer. A alta do dólar pode ser uma tristeza ou uma oportunidade - depende do ponto de vista. Nunca foi tão interessante ganhar em dólares.

O Brasil nunca perde a oportunidade de perder uma oportunidade. Esses dias vi um filme sobre o Barão de Mauá. Este país parece um eterno conflito entre aqueles que querem o desenvolvimento da nação e velhas elites que só querem conservar o poder. País desindustrializado é pais pobre.

2) Fazer faculdade, mas não esperar nada dela, com emprego autônomo em paralelo - Se estiver com receio de ir para outro país, faça uma faculdade, mas não espere nada de um canudinho de papel. Como diz o Renan do Choque de Cultura: "Faculdade no Brasil é um grande recreio de quatro anos que, quando bate o sinal, você está desempregado". Vivemos em uma era de alto desemprego entre jovens e adultos diplomados. O ideal é que faça faculdade, mas, ao mesmo tempo, trabalhe. Movimento é vida. Se não conseguir emprego formal, esteja disposto a ser motorista de Uber, entregador de aplicativo, corretor de imóveis, pedreiro, marceneiro ou qualquer outra profissão com algum grau de autonomia. Comece a fazer dinheiro rápido, o quanto antes. Estude, leia livros, aprenda coisas diferentes. Comece a errar bastante para um dia conseguir acertar. Não tenha medo de errar. Se ficar parado seu fracasso é garantido; nunca se esqueça: você nasceu em uma família pobre, sem herança e sem QI !!! Comece a poupar desde seu primeiro salário e a investir seu dinheiro. Não despreze cursos técnicos/tecnólogos.

3) Fazer concursos públicos - Já foi melhor, mas não deixa de ser uma opção. Não seja apegado a cidade, cargo, órgão, nem a nada. Abra, pelo menos uma vez por semana, o site PCI Concursos e procure por vagas que você possa se candidatar. "Ah, mas paga pouco", "Ah, mas é longe". Foda-se. Movimento é vida. Estude, prepare-se e esteja disposto a ir para o "Cafundó do Prego" se essa for a opção mais rápida. Continue a estudar até alcançar posições melhores. A melhor forma de estudar é fazer muitos exercícios, até não aguentar mais.

4) Em hipótese alguma arrume filhos antes de se estabelecer economicamente - Se tivesse um jeito, eu arrancava seu pinto por uns 10 anos só para garantir que não cometa esse erro - e depois devolvia. Se tiver filhos, seja homem e assuma suas responsabilidades como pai.

5) Esqueça rede social, netflix, disney, video-game, Big Brother, twitter, instagram e essa papagaiada toda - A menos que trabalhe com isso, afaste-se dessas coisas que não vão ajudá-lo em coisa alguma, principalmente no início da vida adulta. Pobre que entra nisso aí vive alienado por toda a vida. Substitua essa porcaria pela busca de conhecimento, através de livros e cursos que agreguem algum valor.

6) Doe seu tempo ou seu dinheiro para quem precisa: Ajude um asilo, creche ou pessoas necessitadas. Se não tiver dinheiro, doe seu tempo - o principal ativo de sua vida. Dessa forma, você fará o bem ao próximo e a si mesmo. Aprenda a agradecer por aquilo que tem e a ajudar quem mais precisa. Seja rico em ajudar o outro. É a maior riqueza na vida de um ser humano.

7) Pare de esperar oportunidades maravilhosas e grandes chances que caem do céu. Na cabeça de pobre periférico só cai chuva e bala perdida. Você precisa criar suas próprias oportunidades.

8) Nunca, em hipótese alguma, se faça de vítima  - Fragilidade atrai agressividade. Presas atraem predadores.

9) Não tenha medo de se envolver em um relacionamento sério, caso a pessoa valha a pena - É melhor do que viver de galho em galho e descobrir, aos 40 anos, que perdeu ótimas oportunidades ao longo da vida só para se sentir "livre e desimpedido".

Enfim pessoal, esses foram os conselhos. Podem se perguntar: por que não falou do empreendedorismo? Porque conheço meu primo e sei que, no momento, não é uma opção. Mas pode ser para você. Aliás, se tiver o perfil, pode ser a melhor. Acho, também, que não podemos romantizar o empreendedorismo como se o Brasil - ao se tornar uma nação de vendedores de bolo de pote, picolé e pano no sinal - fosse se tornar rica e desenvolvida. Empreendedorismo não é para todos, infelizmente. Ou você prefere uma nação de empreendedores youtubers e traders

Reitero que esses conselhos foram para o meu primo. Cada um deve adaptar-se à sua realidade. Uma outra opção, bem interessante, é tentar mudar de região no país, para um local com mais chances e crescimento econômico. Quem é de cidade pequena - e pobre - já nasce com isso na cabeça. 

Por óbvio, os conselhos dizem respeito a decisões e escolhas individuais. Não tenho por princípio e jamais aconselharei um jovem da periferia, que nem gosta muito de estudar, a acreditar em soluções políticas mirabolantes - mitos e outras bostas - ou saídas coletivas em um país como o Brasil - revolução, golpe, anarcocapitalismo, socialismo, blá blá blá. No Brasil, pobre que acredita em solução coletiva está apenas atraindo mais pobreza. Não espere isso de um país que demorou tanto tempo para abolir a escravidão. 

Um amigo tem uma tese de que a história dos golpes e revoluções no Brasil - no século XX - são do tipo "muda tudo só para continuar do mesmo jeito" - pelo menos para quem é pobre; diz que as grandes mudanças no país - 1808, 1822, 1889, 1930, 1964 e 1988 não foram movimentos de massa - genuinamente populares -, mas grupos da elite dando golpes em outros grupos da elite, apoiados por alguns setores da classe média. Não sei se está correto, mas, para quem conhece a história do Brasil, é uma teoria que faz algum sentido. O povo, de fato, nunca esteve no poder - e continua longe dele, bem longe. É um país feito, concebido e conservado para poucos. Considero como povo a maioria esmagadora da população. Nosso sistema de governo é muito mais aristocrático do que um governo do povo, pelo povo e para o povo.

Dia desses eu perguntei ao meu avô onde ele estava quando os militares tomaram o poder em 64. Ele disse: "dirigindo um caminhão". Mudou alguma coisa na sua vida depois? "Nada, continuei dirigindo caminhão". As mesmas respostas obtive sobre o período das Diretas Já e 1988. Quando perguntei sobre o confisco da poupança do Collor, deu uma gargalhada e disse: "você acha mesmo que nossa família tinha algum dinheiro para colocar em poupança ? Mas o Collor é um filho da puta. Pior do que ele só o povo que o elegeu, de novo, para senador". É desse pobre que eu estou falando.

Se pegar alguns políticos e governadores do Brasil é possível traçar uma linha do presente até às elites do Império e, se brincar, até às capitanias hereditárias. Parece gozação, mas não é. 

Recomendo a todos o filme Mauá, o Imperador e o Rei. Se estiver com preguiça assista ao diálogo estabelecido entre o Visconde de Feitosa e Irineu Evangelista - Barão de Mauá, a partir do minuto 29:32. Nunca vi uma conversa que expressasse de forma tão eficaz o que significa o Brasil - seus potenciais e problemas.


Aportes

Aportei em BBAS3 - Banco do Brasil, durante essa fase que a cotação despencou. Para quem não sabe, Mauá teve uma participação na fundação do Banco. A história está aqui: http://mapa.an.gov.br/index.php/menu-de-categorias-2/261-banco-do-brasil-1853-1866

Aportei também em PGMN3, WIZS3, HGRE11, BBRC11, CVBI11, KNRI11, HFOF11, BBPO11 e TORD11.

A carteira ficou assim:


Pretendo chegar a uns 30 FIIs, no mínimo. "Mas não é difícil acompanhar?" Eu tenho um serviço de assinatura que, semanalmente, reporta os fatos relevantes dos FIIs. Leio apenas as notícias relacionadas aos ativos que tenho ou daqueles que mantenho algum interesse. É mais fácil do que parece. Como não tenho tempo nem o hábito de girar muito a carteira, não abro mão da diversificação - a "sabedoria dos ignorantes". A única coisa que penso quando os ativos caem muito é "tomara que continuem assim até o próximo aporte". Na maioria das semanas, nem sei o que subiu ou caiu.

Só por conta da diversificação posso aportar e manter BBPO11, BBRC11, RBVA11, CIEL3, WIZS3, MFII11 e ABCP11 sem me preocupar com os últimos "problemas" que ocorreram nesses ativos.

Eventualmente - bem eventualmente mesmo -, acompanho as discussões no Clube FII e alguns canais no youtube - Baroni, Arthur Vieira de Moraes, André Bacci, Fiique tranquilo e Tetzner - o último com algum cuidado... rsrs... quem conhece sabe do que estou falando. Quem assiste sempre o Tetzner "ou acha que o mundo tá acabando - todo dia - ou vende os FIIs com menos de um mês".  Mas aprecio a autenticidade dele; quando acerta, acerta em cheio.

Livros



Recomendo o livro Cultura Geral de Dietrich Schwanitz. É o livro de um alemão escrito, principalmente, para o povo alemão. Gostei demais da forma como ele aborda o que chama de "cultura geral". É, na verdade, cultura europeia ou cultura "ocidental". Por vezes, aborda temas históricos com superficialidade e muita rapidez, mas é o suficiente para conhecer alguns momentos importantes.

Começa falando sobre os grandes temas do ocidente: Bíblia e mitologia/filosofia grega. Diz que Bíblia, Odisseia e Ilíada são textos fundantes da "civilização ocidental". Acrescentaria, além da cultura judaico-cristã e da filosofia/mitologia grega, o Direito Romano. Algumas instituições romanas estão presentes até hoje em códigos civis da Alemanha, França, Portugal, Espanha e, obviamente, América Latina. É impossível pensar a civilização ocidental sem 3 grandes influências: cristianismo (Igreja Católica/Reforma); democracia e filosofia (gregos) e Direito Romano (Império Romano).

O mais curioso é pensar que, na cabeça do autor - e acredito que de todo europeu - civilização ocidental são eles e, no máximo, Estados Unidos, Canadá, Austrália e Nova Zelândia.

O que mais gostei foi como abordou a vergonha nacional do nazismo e do Hitler. Vale a pena a leitura. 

Recordei-me de 2014 quando estava no jogo Brasil e Alemanha, no Mineirão. No intervalo, o Brasil já perdia de muito e eu e minha esposa estávamos ao lado da torcida alemã. Do nada, um alemão chegou perto de mim. De forma inconsciente tudo o que eu pensei foi: "saia daqui seu nazista de merda". Só pensei, é claro, mas estava prontinho para dizer isso. Ele fez uma cara de "me desculpe" e falou "sorry". Quase fiquei com dó dele. Imagino que a minha cara não estava muito boa e ele deveria estar pensando "é hoje que morro nesse país subdesenvolvido". Contei isso porque meu primeiro ato inconsciente foi associar aquele torcedor feliz com nazista - quase um ato reflexo. Depois disso pensei que deveria ir ao jogo com a camisa da União Soviética debaixo da camiseta do Brasil. Só para garantir o bullying reverso em caso de derrota. 

Lendo o livro do Dietrich, pude entender melhor como esse estigma ainda recai sobre o povo alemão e uma certa dificuldade em lidar com isso - ainda hoje. Enfim, só lendo para perceber. Aquele desejo oculto nas entrelinhas de dizer "olha, não foi tão ruim assim; a maioria não sabia de nada; Hitler foi tenebroso, mas fomos muitos humilhados na 1ª Guerra; fomos enganados, mas outros povos também fizeram cagadas; espanhóis e portugueses fizeram ainda pior com os povos originários". 

Já escrevi demais.

Que venham as vacinas e possamos sair dessa pandemia. Se sobrevivermos, os fatos de 2020-2021 nos marcarão para sempre. Não sei se o pior é a pandemia ou perceber o quanto de maluquice pode existir dentro dos seres humanos.

Um abraço e até a próxima,

3 comentários:

  1. Que aula ao seu primo hein, LeP! Parabéns! E obrigado por compartilhar.

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  2. Olá One. Não sei se vai adiantar muito, mas é o que eu gostaria de ter ouvido se estivesse no lugar dele. Abs.

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  3. - Arrumar um trabalho
    - Economizar dinheiro e fazer um curso técnico para arrumar um trabalho que remunera melhor (Operador de empilhadeira ou Vendedor no Varejo por exemplo)
    - Estudar, ler pelo menos 1 livros por mês.
    - Consumir muito conteúdo de Comunicação/Capitação de clientes
    - Frequentar uma igreja (te ajuda muito a ficar longe de vicios e perdas de tempo)

    No futuro, com um bom dinheiro acumulado e sabendo como as nuances funcionam, empreenderia meu próprio negócio.

    Na verdade, isso que descrevi é o "American Dream' do século 19/20. Infelizmente os jovens hoje perderam essa noção.

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